Pérola

"Nós entendemos que Israel tem o direito de se defender pois nesses últimos anos o Hamas lançou diversos foguetes na região"
Barack Obama

segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Feliz Novo Ano

Então, mais uma vez usamos esse espaço para nos dirigir, diretamente a vocês, leitores e leitoras, que passaram por aqui, ao longo desse ano, ano que podem ter certeza, foi vivido muito intensamente tanto por mim(que vos escrevo agora) quanto pela Dani.

E exatamente por isso mesmo que em vários momento, hora eu, hora a Dani, hora os dois não tivemos tempo para o Blogg, nesse sentido pedimos novamente desculpas a Novembro(o mês que foi Outubro), a imagem dessa postagem tb vai em homenagem à Revolução Russa, e esperamos que vocês continuem acessando o blogg, mesmo quando ele demorar a ser atualizado, rsrs.

Bom vivemos intensamente, vários momentos de Luta, de organização do povo e da classe trabalhadora, viviemos monetos de luta estudantis, vivemos louca nossa paixão pela vida, pela beleza da lua, do mar, das cachoeiras... vivemos pensando um no outro, e esquecendo um pouco tb, enfim vivemos...

Lutamos por que gostamos de viver...

Que em 2008, possamos curtir poesia, ler poemas, contos, crônicas, romances, textos teóricos e o que mais puder... Mas que também lutemos, lutemos para acabar a exploração do homem pelo homem... Muita água ainda vai passar, pelo moinho da Luta de classes, e sei que ano que vem é hora de seguir a reorganização da classe e marchar rumo a vitória!!!

Abraços!!!

Fabiano

Receita de Ano Novo

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ver,
novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta ou recebe mensagens? passa telegramas?).
Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um ano-novo que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.


Carlos Drumond de Andrade

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Nacos de Nuvem

No céu flutuavam trapos
de nuvem - quatro farrapos

do primeiro ao terceiro - gente
o quarto - um camelo errante.

A ele, levado pelo instinto,
no caminho junta-se um quinto.

Do seio azul do céu,
pé-ante-pé,
se desgarra um elefante.


um sexto salta - parece.
Susto: o grupo desaparece.

E em seu rastro
agora se cansa
o sol - amarela girafa.

Maiakovski

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

NOSSA MARCHA

Troa na praça o tumulto!
Altivos pincaros - testas!
Águas de um novo dilúvio
lavando os confins da terra.

Touro mouro dos meus dias.
Lenta carreta dos anos.
Deus? Adeus. Uma corrida.
Coação? Tambor rufando.

Que metal será mais santo?
Balas-vespas nos atingem?
Nosso arsenal é o canto.
Metal? São timbres que tinem.

Desdobra o lençol dos dias
cama verde, campo escampo.
Arco-iris arcoirisa
o corcel veloz do tempo.

O céu tem tédio de estrelas!
Sem ele, tecemos hinos.
Ursa-Maior, anda, ordena
para nós um céu de vovos.

Bebe e celebra! Desata
nas veias a primavera!
Coração, bate a combate!
O peito - bronze de guerra.

(Poemas - Vladímir Maiakóvski. Trad. Haroldo de Campos. Tempo Brasileiro, 1967, pp. 77-8)
do site da Apropuc: http://www.apropucsp.org.br/revista/rcc01_r11.htm

Desculpas a Novembro, o mês que foi Outubro...

Bom, a todos e todas, leitores e leitoras desse blogg, pedimos nossas mais sinceras desculpas, desculpas a todos e todas vocês, e as nossas mais sinceras desculpas a Novembro, om?ês que foi Outubro, naqueles dias revolucionários da Rússia, em 1917, quando o calendário Gregoriano,com13 dias a menos que o nosso calendário Juliano, não permitiu que a revolução entrasse pra história como a revolução do novembro.

Pedimos desculpas, por não terpostado nenhuma poesia neste mês, e por no aniversário de 90 anos da Revolução Russa, fomos tão displicentes... com o blogg, mas não com as lutas e muito menos com nossas vidas, foi exatamente a combinação das duas que não nos permitiram dar a atenção merida a esse pequeno, mas interessante espaço, e por estas razões, esparamos ser desculpados.

Para reparar o erro, entraremos dezembro, com reaprando uma outra falta não menos grave, com um poema do Maiakovski, tanto homenageando a revolução russa e o poeta quemelhor esxpressou aqueles dias, quanto a ele próprio.

Fabiano e Dani

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

A fruta aberta

Agora sei quem sou.
Sou pouco, mas sei muito,
porque sei o poder imenso
que morava comigo,
mas adormecido como um peixe grande
no fundo escuro e silencioso do rio
e que hoje é como uma árvore plantada
bem alta no meio da minha vida.

Agora sei as coisa como são.
Sei porque a água escorre meiga
e porque acalanto é o seu ruído
na noite estrelada
que se deita no chão da nova casa.
Agora sei as coisas poderosas
que valem dentro de um homem.

Aprendi contigo, amada.
Aprendi com a tua beleza,
com a macia beleza de tuas mãos,
teus longos dedos de pétalas de prata,
a ternura oceânica do teu olhar,
verde de todas as cores
e sem nenhum horizonte;
com tua pele fresca e enluarada,
a tua infância permanente,
tua sabedoria fabulária
brilhando distraída no teu rosto.

Grandes coisas simples aprendi contigo,
com o teu parentesco com os mitos mais terrestres,
com as espigas douradas no vento,
com as chuvas de verão
e com as linhas da minha mão.
Contigo aprendi que o amor reparte
mas sobretudo acrescenta,
e a cada instante mais aprendo
com o teu jeito de andar pela cidade
como se caminhasses de mãos dadas com o ar,
com o teu gosto de erva molhada,
com a luz dos teus dentes,
tuas delicadezas secretas,
a alegria do teu amor maravilhado,
e com a tua voz radiosa
que sai da tua boca
inesperada como um arco-íris
partindo ao meio e unindo os extremos da vida,
e mostrando a verdade
como uma fruta aberta.

(Sobrevoando a Cordilheira dos Andes, 1962)

Thiago de Mello
ps: a foto foi tirada por José Soares

domingo, 21 de outubro de 2007

Elogio do Revolucionário


Quando aumenta a repressão, muitos desanimam.

Mas a coragem dele aumenta.

Organiza sua luta pelo salário, pelo pão

e pela conquista do poder.

Interroga a propriedade:

De onde vens?

Pergunta a cada idéia:

Serves a quem?

Ali onde todos calam, ele fala

E onde reina a opressão e se acusa o destino,

ele cita os nomes.

À mesa onde ele se sentase senta a insatisfação.

À comida sabe mal e a sala se torna estreita.

Aonde o vai a revolta

e de onde o expulsam

persiste a agitação.


Brecht

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Privatizado


"Privatizaram sua vida,
seu trabalho, sua hora de amar
e seu direito de pensar.
É da empresa privada
o seu passo em frente,
seu pão e seu salário.
E agora não contente
querem privatizar o conhecimento,
a sabedoria, o pensamento,
que só à humanidade pertence."

Brecht

Para os que Virão



Como sei pouco e sou pouco,
Faço o pouco que me cabe
Me dando inteiro.
Sabendo que não vou ver
O homem que eu quero ser.
Já sofri o suficiente
Para não enganar a ninguém:
Principalmente aos que sofrem
Na própria vida, a garra.
Da opressão, e nem sabem.
Não, não tenho o sol escondido no meu.
Bolso de palavras.
Sou simplesmente um homem
Para quem já a primeira
E desolada pessoa
Do singular – foi deixando,
Devagar, sofridamente
De ser, para tranformar-se-
Muito mais sofridamente-
Na primeira e profunda pessoa do plural.
Não importa que doa: é tempo
De avançar de mãos dadas
Com quem vai no mesmo rumo,
Mesmo que longe ainda esteja
De aprender a conjugar
O verbo amar.
É tempo sobretudo
De deixar de ser apenas
A solitária vanguarda
De nós mesmos.
Se trata de ir ao encontro.
(dura no peito, arde a límpida verdade de nossos erros)
Se trata de abrir o rumo.
Os que virão, serão povo,
E saber serão, lutando.

Thiago de Mello, 1978

Alma humana




A alma humana é um manicômio de caricaturas.
Se uma alma pudesse revelar-se com verdade
E nem houvesse um pudor
mais profundo que todas
as vergonhas conhecidas, definidas
Seria, como dizem, da verdade o poço.
Mas um poço sinistro, cheio de ecos vagos,
habitado por vidas ignóbeis,
viscosidades sem vida, lesmas sem ser.
Ranho da subjetividade.
Eis a alma.

Fernando Pessoa

Palhaço


Quando eu era jovem, eu pensava que com a arte seria possível mudar o mundo.

Eu buscava constantemente um espetáculo que pudesse despertar no coração do público uma esperança.

Eu queria mostrar uma maneira diferente de viver, com mais amizade, criatividade, sem a obrigação de perseguir o dinheiro e o poder.

Ilusão fútil que eu nunca consegui alcançar.

Não só a revolução não chegou, como as pessoas se tornaram cada vez mais loucas e materialistas.

Quando eu me dei conta disto eu vivi momentos difíceis pensando, pensando inclusive que minha vida era um fracasso e que todo esforço era inútil.

Mas um dia eu tive uma revelação: se não se pode mudar o mundo, pelo menos é possível mudar a si mesmo, encontrar algo em seu coração, um desejo, uma necessidade e entregar-se totalmente a ele, sem olhar para trás.

Isso não é para a sociedade ou para os outros, não, é para você mesmo. E eu fazendo esse palhaço que eu sou, eu encontrei essa coisa.

Provocar, burlar e fazer o público rir.

Isso era tudo o que eu buscava em minha vida.

Por certo eu não mudava o mundo, mas os palhaços nunca mudaram o mundo, passam o tempo tentando sem nunca conseguir, por isso são palhaços.

Os palhaços gostam do fracasso e das ações ineficazes, são perdedores alegres e isto é a verdadeira força que têm, nunca se cansam de perder.

Desfrutam de cada fracasso e voltam em seguida a fracassar de novo, diluindo assim as certezas das pessoas sérias e que nunca duvidam.

Então, esse sangue que pareço ter na minha cabeça, esse sangue que tenho sobre a minha camisa, esse sangue que tenho no meu coração, esse sangue que está todo em mim é tão patético e inútil em seu simbolismo porque é sangue de um palhaço.

Um sangue que não vem de uma grande luta ou em nome de uma causa heróica.

É sangue de brincadeira, ao mesmo tempo verdadeiro e pouco importante.


Autor desconhecido

domingo, 30 de setembro de 2007

Ocupações João de Barro para além dos despejos


Na madrugada do dia 07 de setembro deste ano, 50 famílias, em sua maioria vindas da ocupação João de Barro I, no bairro Serra, em Belo Horizonte ocuparam o edifício do antigo Hospital Cardiocentro, na Avenida Antonio Carlos. A ocupação escolheu o dia 7 de setembro, dia oficial da nossa independência, para dizer aos belorizontinos e a todos os brasileiros que, de fato, nossa independência ainda não aconteceu. A primeira ocupação João de Barro aconteceu no dia 28 de abril deste ano, no bairro Serra. As famílias que ocuparam o prédio abandonado são em sua maioria provenientes dos núcleos de moradia de BH. Fizeram a ocupação como forma de protesto e luta pelo direito à casa própria. A prefeitura de BH criou uma fila para as famílias de baixa renda que atinge em torno de 13.000 famílias inscritas e promete construir 300 casas ano, ou seja, se a fila não aumentar serão 40 anos de espera para que se acabe com a mesma. Para acabar com o déficit habitacional da cidade, que segundo dados oficias é de 55.000 famílias, mas o movimento acredita ser muito mais, será aproximadamente 100 anos. Algumas pessoas estão a dez anos esperando o benefício, enquanto isto moram de favor, em barracos de madeirite, em áreas de risco ou pagam aluguéis que em muito oneram a renda familiar, comprometendo a alimentação, o estudo, a saúde, o lazer da família. Diante desse quadro, os movimentos se organizaram para cobrar da prefeitura de BH uma política habitacional que realmente atenda às famílias de baixa renda e atenda com urgência, pois não se pode esperar 100 anos para se ter a casa própria. Por isso, foi realizada a ocupação Caracol e a primeira ocupação João de Barro. Queríamos mostrar, com estes atos, que existem em BH muitas famílias que precisam de moradia e existem formas de resolver este problema, pois são mais de 70.000 mil imóveis vazios que não cumprem sua função social, sendo passíveis de desapropriação para serem destinados à moradia popular. Portanto, foi para isto que existe no Estatuto das Cidades, o instrumento de lei chamado Iptu Progressivo, que pode ser aplicado em casos como o do prédio do bairro Serra que há 11 anos não paga IPTU. No entanto, não conseguimos nem abrir o diálogo com a prefeitura, que diz não ser problema a ser resolvido pelos órgãos públicos. Enquanto isso o judiciário se movimentava para retirar as famílias da João de Barro e no dia 30 de agosto foi julgada nossa retirada do prédio, desde então a qualquer momento a polícia militar poderá efetuar o despejo. Por este motivo, as famílias da ocupação João de Barro resolveram se dividir e se somar a outras famílias e no dia 7 de setembro realizaram outra ocupação, para mostrar a todos que nossa independência realmente, ainda não existe; para mostrar que o judiciário preferiu julgar a favor do escritório de advocacia Viviane Amaral, que vive de especulação imobiliária; a favor do jornal Estado de Minas que também é proprietário do imóvel, e que é, como todos sabem, controlado pelo governador Aécio Neves, e a favor de tantas outras empresas proprietárias desse imóvel, jogando na rua 100 famílias que precisam de moradia. Ocuparam, acima de tudo, para mostrar que os órgãos públicos se omitem diante de um problema social, que cabe a eles resolverem, porque como reza na nossa constituição federal, moradia é direito de todos e dever, obrigação do Estado. A nova ocupação recebeu o nome de João de Barro II, porque, “João de Barro” não é um prédio, é um movimento em luta pela efetivação de um direito. Podem nos retirar de quantos prédios e terrenos abandonados, para que voltem a ser locais insalubres, focos de doenças e criminalidade e para que voltem às mãos dos especuladores imobiliários, que nós continuaremos existindo na cidade. Enquanto houver pessoas dispostas a ir a luta pela efetivação de seus direitos existirá a João de Barro, que como o pássaro, constrói sua casa com carinho e dedicação. Assim são as ocupações, uma forma de buscar a casa própria com carinho, dedicação, enfrentando todas as intempéries para que, enfim, possamos ter um local para vivermos com dignidade, para que possamos ter um país livre, e de fato soberano, no qual os interresses de seu povo, os interesses da maioria sejam o guia de nossa pátria.

07 de setembro de 2007

Brigadas Populares

Fórum de Moradia do Barreiro

PANTERA




De tanto olhar as grades seu olhar

esmoreceu e nada mais aferra.

Como se houvesse só grades na terra:

grades, apenas grades para olhar.

A onda andante e flexível do seu vulto

em círculos concêntricos decresce,

dança de força em torno a um ponto oculto

no qual um grande impulso se arrefece.

De vez em quando o fecho da pupila

se abre em silêncio. Uma imagem, então,

na tensa paz dos músculos se instila

para morrer no coração.


Rainer Maria Rilke

(Trad. Augusto de Campos)

Aprenizado


Depois de algum tempo a gente aprende os verdadeiros valores da vida, eu demorei 21 anos para descobrir os meus, ainda não sei se eles me acompanharão em toda minha jornada, pois estamos sempre em mutação, mas nos últimos 15 dias pude perceber que a sabedoria não está nos livros e sim na terra e na convivência com outras pessoas, a vida é uma troca e o nosso papel é oferecer o que tem de mais puro em nossa alma, sei que não é um caminho fácil, é uma construção feita através de erros, o importante é adimitir que errou e tentar melhorar a cada dia.Quero sentir o próximo que se encontra a meu lado, pode ser dentro do metro, a caminho da faculdade, ás vezes não é preciso nem palavras, apenas gestos que consigam demosntrar quanto amor você tem para dar e o mais impressionante é ver que esse amor que está doando na verdade é alimento para seu corpo e alma, na hora que você recebe o sorriso de uma criança, que você recebe o abraço de um idoso ou quando recebe o conselho de alguém que te quer bem.
Danielle Vassalo

O sobrevivente


Impossível compor um poema

a essa altura da evolução da humanidade.

Impossível escrever um poema

- uma linha que seja- de verdadeira poesia.

O último trovador morreu em 1914.

Tinha um nome que ninguém se lembra mais.

Há máquinas terrivelmente complicadas

para as necessidades mais simples.

Se quer fumar um charuto aperte um botão.

Paletós abotoam-se por eletricidade.

Amor se faz pelo sem-fio.

Não precisa de estômago para digestão.

Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta muito

para atingirmos um nível razoável de cultura.

Mas ate´lá, felizmente, estarei morto.

Os homens não melhoram e matam-se como percevejos.

Os percevejos heróicos renascem.

Inabitável, o mundo e´cada vez mais habitado.

se os olhos reaprendessem a chorar

seria um segundo dilúvio.

(desconfio que escrevi um poema)


Caros Drummond de Andrade

júlio cortázar


E depois de fazer tudo o que fazem,

se levantam, se banham, se entalcam,

se perfumam, se penteiam, se vestem,

e assim progressivamente vão voltando

a ser o que não são.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Vandré

De todas as mortes que carrego,
marcadas em minha alma feito cicatrizes,
de todos os crimes da ditadura
um me dói de forma especial.

Não é a multidão de mortos
com seus corpos dilacerados.
Não são os ossos perdidos
que buscam por seus nomes.

Não é o tiro
o choque
o murro.

É o poema que não foi feito,
a música inacabada,
aquela melodia presa na mente
soterrada pelo medo.

Os dedos inúteis longe das cordas,
o acorde que nunca foi desperto,
os olhos secos das lágrimas justas,
a voz calada.
Que requinte mas perverso de crueldade:
matar alguém e deixar seu corpo vivo
como testemunha da morte inacabada.
Mauro Iasi

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Orientação

menos que retratar:
fazer do verbo a bússola
para o amanhã

menos que chorar:
a-r-marem gestos e palavras
o braço que é trocado
por cifrões


não mais murmúrios
de ventos noturnos:
agora é o grito claro
despertando o sol de amor
por sabres dilacerado
antes mesmo da aurora

não mais a doce esperança
ingênua como criança:
hoje vale a certeza
do árduo caminho à frente
(berço de mil ciladas)
a ser trilhado levando
a verdade feita tocha, canção, faca
com gosto de madrugada.

Mário Jorge

Aula de Vôo



Aula de Vôo

O conhecimento
caminha lento feito lagarta.
Primeiro não sabe que sabe
e voraz contenta-se com cotidiano orvalho
deixado nas folhas vividas das manhãs.

Depois pensa que sabe
e se fecha em si mesmo:
faz muralhas,
cava Trincheiras,
ergue barricadas.
Defendendo o que pensa saber
levanta certeza na forma de muro,
orgulha-se de seu casulo.

Até que maduro
explode em vôos
rindo do tempo que imagina saber
ou guardava preso o que sabia.
Voa alto sua ousadia
reconhecendo o suor dos séculos
no orvalho de cada dia.

Mas o vôo mais belo
descobre um dia não ser eterno.
É tempo de acasalar:
voltar à terra com seus ovos
à espera de novas e prosaicas lagartas.

O conhecimento é assim:
ri de si mesmo
E de suas certezas.
É meta de forma
metamorfose
movimento
fluir do tempo
que tanto cria como arrasa

a nos mostrar que para o vôo
é preciso tanto o casulo
como a asa


Mauro Iasi

terça-feira, 7 de agosto de 2007

O sertão


"O sabiá no sertão

Quando canta me comove

Passa três meses cantando

E sem cantar passa nove

Porque tem a obrigação

De só cantar quando chove"


Zé Bernardinho

OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO


Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.


Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.


Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

Carlos Drummond

Guerreiro


"No caminho do guerreiro, cabe a você discernir o que foi tecido pelos fios divinos e o que foi tecido pelos fios humanos. Quando você principia a discernir, você se torna um Txucarramãe - um guerreiro sem armas. Porque os fios tecidos pela mão do humano formam pedaços vivificados pelo seu espírito. Essa mão gera todos os tipos de criação. Muitas coisas fazem parte de você para se defender do mundo externo, geradas pela sua própria mão e pelo seu pensamento. Quando você descobre o que tem feito da sua vida e como é sua dança no mundo, desapega-se aos poucos das armas, que são criações feitas para matar criações. De repente, descobre-se que, quando paramos de criar o inimigo, extingue-se a necessidade das armas.”(Kaká Werá Jecupé)

Encerramento da carta redigida no 5º Congresso Nacional do MST


Conclamamos o povo brasileiro para que se organize e lute por uma sociedade justa e igualitária, que somente será possível com a mobilização de todo o povo. As grandes transformações são sempre obra do povo organizado. E, nós do MST, nos comprometemos a jamais esmorecer e lutar sempre.Reforma agrária: Por Justiça Social e Soberania Popular!

Brasília, 16 de junho de 2007

As palavras


O que amo em minha loucura

é que ela me protegeu, desde o primeiro dia,

contra as seduções da ''elite'':

nunca me julguei feliz proprietário de um ''talento'':

minha única preocupação era salvar-me

-- nada nas mãos, nada nos bolsos --

pelo trabalho e pela fé.

Desta feita, minha pura opção não me elevava acima de ninguém:

sem equipamento, sem instrumental,

lancei-me por inteiro à ação para salvar-me por inteiro.

Se guardo a impossível Salvação na loja dos acessórios, o que resta?

Todo homem, feito de todos os homens,

que os vale todos e a quem vale não importa quem.

Memórias - Jean Paul Sartre

Viajar


Viajar?

Para viajar basta existir.

Vou de dia para dia, como de estação

para estação, no comboio do meu corpo,

ou do meu destino,

debruçado sobre as ruas e as praças,

sobre os gestos e os rostos,

sempre iguais e sempre diferentes,

como,afinal, as paisagens são.

Se imagino, vejo.

Que mais faço eu se viajo?

Só a fraqueza extrema da imaginação

justifica que se tenha que deslocar para sentir.

"Qualquer estrada, esta mesma estrada de Entepfuhl,

te levará até ao fim do mundo".

Mas o fim do mundo,

desde que o mundo se consumou dando-lhe a volta,

é o mesmo Entepfuhl de onde se partiu.

Na realidade, o fim do mundo,

como o principio, é o nosso conceito do mundo.

É em nós que as paisagens tem paisagem.

Por isso, se as imagino, as crio;

se as crio, são; se são, vejo-as como ás outras.

Para que viajar? Em Madrid,em Berlim,

na Pérsia, na China, nos Pólos ambos,

onde estaria eu senão em mim mesmo,

e no tipo e gênero das minhas sensações?

A vida é o que fazemos dela.

As viagens são os viajantes.

O que vemos, não é o que vemos,

senão o que somos.


Fernando Pessoa

Fernando Pessoa


Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas ...

Que já têm a forma do nosso corpo ...

E esquecer os nossos caminhos

que nos levam sempre aosmesmos lugares ...

É o tempo da travessia ...

E se não ousarmos fazê-la ...

Teremos ficado ...

para sempre ...

À margem de nós mesmos..."

sábado, 30 de junho de 2007

Santos


Santos: é no Brasil, e faz já quatro vezes dez anos.
Alguém ao meu lado conversa "Pelé é um super-homem",
"não sou um aficcionado, mas na televisão eu gosto".
Antes era selvático este ponto
e cheirava como uma axila do Brasil caloroso.
É um barco, e é outro, mil barcos!
Agora os frigoríficos estabeleceram catedrais de belo cinza,
e parecem jogos de dados de deuses os brancos edifícios.
Quantos grãos de café, quantas gotas salobres de suor?
Talvez o mar se encheria, mas a terra não,
nunca a terra, nunca satisfeita, faminta sempre de café,
sedenta de suor negro!Terra maldita,
espero que arrebentes um dia, de alimentos,
de sacos mastigados e de eterno suor de homens
que já morreram e foram substituídos para continuar suando.


Pablo Neruda

Desbarato


O desbarato mais absurdo
não é o dos bens de consumo,
mas o da humanidade:
milhões e milhões de seres humanos
nasceram para ser trucidados pela História,
milhões e milhões de pessoas
que não possuíam mais do que as suas simples vidas.
De pouco ela lhes iria servir,
mas nunca faltou quem de tais miudezas
se tivesse sabido aproveitar.
A fraqueza alimenta a força,
para que a força esmague a fraqueza.
José Saramago

Ei-los em pé

O que vocês esperavam que acontecesse quando tiraram a mordaça que tapava essas bocas negras?Esperavam que elas lhes lançassem louvores? E essas cabeças que seus avós e seus pais haviam dobrado à força até o chão?O que esperavam? Que se reerguessem com adoração nos olhos?Ei-los em pé. Homens que nos olham. Ei-los em pé. Faço votos para que vocês sintam como eu a comoção de ser visto.Hoje, esses homens pretos nos miram e nosso olhar re-entra em nossos olhos. Tochas negras iluminam o mundo e nossas cabeças brancas não passam depequenas luminárias balançadas pelo vento.
Jean-Paul Sartre

Prossigamos


Toda via prossigamos!

Seja de que maneira for!

Saiamos a campo para a luta, lutemos, então!

Não vimos já como a crença removeu montanhas?

Não basta então termos descoberto

que alguma coisa está sendo ocultada?

Essa cortina que nos aculta isto e aquilo,

é preciso arrancá-la!


Bertolt Brecht

Haiti






Quando você for convidado pra subir no adro

Da fundação casa de Jorge Amado
Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos

Dando porrada na nuca de malandros pretos

De ladrões mulatos e outros quase brancos

Tratados como pretosSó pra mostrar aos outros quase pretos(E são quase todos pretos)

E aos quase brancos pobres como pretos

Como é que pretos, pobres e mulatos

E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados

E não importa se os olhos do mundo inteiro

Possam estar por um momento voltados para o largo

Onde os escravos eram castigados

E hoje um batuque um batuque

Com a pureza de meninos uniformizados de escola secundária

Em dia de parada

E a grandeza épica de um povo em formação

Nos atrai, nos deslumbra e estimula

Não importa nada:

Nem o traço do sobrado

Nem a lente do fantástico,

Nem o disco de Paul Simon

Ninguém, ninguém é cidadão

Se você for a festa do pelô, e se você não for

Pense no Haiti, reze pelo Haiti

O Haiti é aqui

O Haiti não é aqui

E na TV se você vir um deputado em pânico mal dissimulado

Diante de qualquer, mas qualquer mesmo, qualquer, qualquer

Plano de educação que pareça fácil

Que pareça fácil e rápido

E vá representar uma ameaça de democratização
Do ensino do primeiro grau

E se esse mesmo deputado defender

a adoção da pena capital

E o venerável cardeal disser

que vê tanto espírito no feto

E nenhum no marginal

E se, ao furar o sinal, o velho sinal vermelho habitual

Notar um homem mijando na esquina da rua sobre um saco

Brilhante de lixo do Leblon

E quando ouvir o silêncio sorridente de São Paulo

Diante da chacina111 presos indefesos, mas presos são quase todos pretos

Ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres

E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os pretos

E quando você for dar uma volta no Caribe

E quando for trepar sem camisinha
E apresentar sua participação inteligente no bloqueio a Cuba

Pense no Haiti,

reze pelo Haiti

O Haiti é aqui

O Haiti não é aqui



Caetano Veloso e Gilberto Gil

sábado, 9 de junho de 2007

Eu aqui me despeço


Eu me despeço.

Volto à minha casa, em meus sonhos.

Volto à Patagônia, aonde o vento golpeia os estábulos e salpica de frescor o Oceano.

Sou nada mais que um poeta: amo a todos, ando errante pelo mundo que amo.

Em minha pátria, prende-se mineiros e os soldados mandam mais que os juízes.

Entretanto, amo até mesmo as raízes de meu pequeno país frio.

Se tivesse que morrer mil vezes, ali quero morrer.

Se tivesse que nascer mil vezes, ali quero nascer.

Perto da araucária selvagem, do vendaval que vem do sul,

das campanas recém compradas.

Que ninguém pense em mim.

Pensemos em toda a terra, golpeando com amor a mesa.

Não quero que volte o sangue... a molhar o pão, os feijões, a música:

quero que venha comigo o mineiro, a criança, o advogado, o marinheiro, o fabricante de bonecas.

Que entremos no cinema e bebamos o vinho mais tinto.

Eu não vim para resolver nada.

Vim aqui para cantar e quero que cantes comigo.


Pablo Neruda

terça-feira, 5 de junho de 2007

Patria Minha




A minha pátria é como se não fosse, é íntima
Doçura e vontade de chorar;
uma criança dormindo
É minha pátria. Por isso, no exílio
Assistindo dormir meu filho
Choro de saudades de minha pátria.

Se me perguntarem o que é a minha pátria direi:
Não sei. De fato, não sei
Como, por que e quando a minha pátria
Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água
Que elaboram e liquefazem a minha mágoa
Em longas lágrimas amargas.

Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos...
Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
E sem meias pátria minha
Tão pobrinha!

Porque te amo tanto, pátria minha, eu que não tenho
Pátria, eu semente que nasci do vento
Eu que não vou e não venho, eu que permaneço
Em contato com a dor do tempo, eu elemento
De ligação entre a ação o pensamento
Eu fio invisível no espaço de todo adeus
Eu, o sem Deus!

Tenho-te no entanto em mim como um gemido
De flor; tenho-te como um amor morrido
A quem se jurou; tenho-te como uma fé
Sem dogma; tenho-te em tudo em que não me sinto a jeito
Nesta sala estrangeira com lareira
E sem pé-direito.

Ah, pátria minha, lembra-me uma noite no Maine, Nova Inglaterra
Quando tudo passou a ser infinito e nada terra
E eu vi alfa e beta de Centauro escalarem o monte até o céu
Muitos me surpreenderam parado no campo sem luz
À espera de ver surgir a Cruz do Sul
Que eu sabia, mas amanheceu...

Fonte de mel, bicho triste, pátria minha
Amada, idolatrada, salve, salve!
Que mais doce esperança acorrentada
O não poder dizer-te: aguarda...
Não tardo!

Quero rever-te, pátria minha, e para
Rever-te me esqueci de tudo
Fui cego, estropiado, surdo, mudo
Vi minha humilde morte cara a cara
Rasguei poemas, mulheres, horizontes
Fiquei simples, sem fontes.

Pátria minha... A minha pátria não é florão, nem ostenta
Lábaro não; a minha pátria é desolação
De caminhos, a minha pátria é terra sedenta
E praia branca; a minha pátria é o grande rio secular
Que bebe nuvem, come terra
E urina mar.

Mais do que a mais garrida a minha pátria tem
Uma quentura, um querer bem, um bem
Um libertas quae sera tamem
Que um dia traduzi num exame escrito:
"Liberta que serás também"
E repito!

Ponho no vento o ouvido e escuto a brisa
Que brinca em teus cabelos e te alisa
Pátria minha, e perfuma o teu chão...
Que vontade de adormecer-me
Entre teus doces montes, pátria minha
Atento à fome em tuas entranhas
E ao batuque em teu coração.

Não te direi o nome, pátria minha
Teu nome é pátria amada, é patriazinha
Não rima com mãe gentil
Vives em mim como uma filha, que és
Uma ilha de ternura: a Ilha Brasil, talvez

Agora chamarei a amiga cotovia
E pedirei que peça ao rouxinol do dia
Que peça ao sabiá
Para levar-te presto este avigrama:
"Pátria minha, saudades de quem te ama...
Vinicius de Moraes

Confissão


Não amei bastante meu semelhante,
não catei o verme nem curei a sarna.
Só proferi algumas palavras,
melodiosas,tarde, ao voltar da festa.


Dei sem dar e beijei sem beijo.
(Cego é talvez quem esconde os olhos
embaixo do catre.) E na meia-luz
tesouros fanam-se, os mais excelentes.


Do que restou, como compor um homem
e tudo que ele implica de suave,
de concordâncias vegetais, murmúrios
de riso, entrega, amor e piedade?


Não amei bastante sequer a mim mesmo,
contudo próximo. Não amei ninguém.
Salvo aquele pássaro – vinha azul e doido –
que se esfacelou na asa do avião.


Carlos Drummond de Andrade

domingo, 3 de junho de 2007

Nós, Latino-americanos


Somos todos irmãos
Mas não porque tenhamos
a mesma mãe e o mesmo pai:
temos é o mesmo parceiro que nos trai.
Somos todos irmãos
Não porque dividamos
O mesmo teto e a mesma mesa:
Dividamos a mesma espada
Sobre nossa cabeça.
Somos todos irmãos
Não porque tenhamos
O mesmo berço, o mesmo sobrenome:
Temos um mesmo trajeto
De sanha e fome.
Somos todos irmãos
Não porque seja o mesmo o sangue
Que no corpo levamos:
O que é o mesmo é o modo
Como o derramamos.
Ferreira Gullar

Mário Quintana


Olho em redor do bar em que escrevo estas linhas. Aquele homem ali no balcão, caninha após caninha, nem desconfia que se acha conosco desde o início das eras. Pensa que está somente afogando problemas dele, João Silva… Ele está é bebendo a milenar inquietação do mundo!”

terça-feira, 1 de maio de 2007

A INTERNACIONAL


De pé ó vítimas da fome
De pé famélicos da terra
Da idéia a chama já consome
A crosta bruta que a soterra
Cortai o mal bem pelo fundo
De pé, de pé, não mais senhores
Se nada somos em tal mundo
Sejamos tudo ó produtores.

Refrão:
Bem unidos façamos
Nesta luta final
Uma terra sem amos
A Internacional

Senhores patrões chefes supremos
Nada esperamos de nenhum
Sejamos nós que conquistemos
A terra mãe livre comum
Para não ter protestos vãos
Para sair deste antro estreito
Façamos com nossas mãos
Tudo o que a nós nos diz respeito.

Refrão

O crime do rico a lei o cobre
O Estado esmaga o oprimido
Não há direito para o pobre
Ao rico tudo é permitido.
À opressão não mais sujeitos
Somos iguais todos os seres
Não mais deveres sem direitos
Não mais direitos sem deveres

Refrão

Abomináveis na grandeza
Os reis da mina e da fornalha
Edificaram a riqueza
Sobre o suor de quem trabalha.
Todo o produto de quem sua
A corja rica o recolheu
Querendo que ele o restitua
O povo quer só o que é seu.

Refrão

Nós fomos de fumo embriagados
Paz entre nós guerra aos senhores
Façamos greve de soldados
Somos irmãos trabalhadores.
Se a raça vil cheia de galas
Nos quer à força canibais
Logo verá que nossas balas
São para os nossos generais

Refrão

Pois somos do povo os ativos
Trabalhador forte e fecundo
Pertence a terra aos produtivos
Ó parasita deixa o mundo.
Ó parasita que te nutres
Do nosso sangue a gotejar
Se nos faltarem os abutres
Não deixa o sol de fulgurar

Refrão


Eugene Pottier

domingo, 29 de abril de 2007

Canción por la unidad latinoamericana


El nacimiento de un mundo

Se aplazó por un momento

Fue un breve lapso del tiempo

Del universo un segundo


Sin embargo parecia

Que todo se iba a acabar

Con la distancia mortal

Que separó nuestras vidas


Realizavan la labor

De desunir nossas mãos

E fazer com que os irmãos

Se mirassem com temor


Cunado passaron los años

Se acumularam rancores

Se olvidaram os amores

Parecíamos estraños


Que distância tão sofrida

Que mundo tão separado

Jamás se hubiera encontrado

Sin aportar nuevas vidas


E quem garante que a História

É carroça abandonada

Numa beira de estrada

Ou numa estação inglória


A História é um carro alegre

Cheio de um povo

Que atropela indiferente

Todo aquele que a negue


É um trem riscando trilhos

Abrindo novos espaços

Acenando muitos braços

Balançando nossos filhos


Lo que brilla con luz propia

Nadie lo puede apagar

Su brillo puede alcanzar

La oscuridad de otras costas


Quem vai impedir que a chama

Saia iluminando o cenário

Saia incendiando o plenário

Saia inventando outra trama


Quem vai evitar que os ventos

Batam portas mal fechadas

Revirem terras mal socadas

E espalhem nossos lamentos


E enfim quem paga o pesar

Do tempo que se gastou

De las vidas que costó

De las que puede costar


Já foi lançada uma estrela

Pra quem souber enxergar

Pra quem quiser alcançar

E andar abraçado nela


Já foi lançada um estrela

Pra quem souber enxergar

Pra quem quiser alcançar

E andar abraçado nela


Pablo Milanés

domingo, 15 de abril de 2007

Mensagem À Poesia

Não posso
Não é possível
Digam-lhe que é totalmente impossível
Agora não pode ser
É impossível
Não posso.
Digam-lhe que estou tristíssimo, mas não posso ir esta noite ao seu encontro.

Contem-lhe que há milhões de corpos a enterrar
Muitas cidades a reerguer, muita pobreza pelo mundo.
Contem-lhe que há uma criança chorando em alguma parte do mundo
E as mulheres estão ficando loucas, e há legiões delas carpindo
A saudade de seus homens; contem-lhe que há um vácuo
Nos olhos dos párias, e sua magreza é extrema; contem-lhe
Que a vergonha, a desonra, o suicídio rondam os lares, e é preciso
reconquistar a vida
Façam-lhe ver que é preciso eu estar alerta, voltado para todos os caminhos
Pronto a socorrer, a amar, a mentir, a morrer se for preciso.
Ponderem-lhe, com cuidado – não a magoem... – que se não vou
Não é porque não queira: ela sabe; é porque há um herói num cárcere
Há um lavrador que foi agredido, há um poça de sangue numa praça.
Contem-lhe, bem em segredo, que eu devo estar prestes, que meus
Ombros não se devem curvar, que meus olhos não se devem
Deixar intimidar, que eu levo nas costas a desgraça dos homens
E não é o momento de parar agora; digam-lhe, no entanto
Que sofro muito, mas não posso mostrar meu sofrimento
Aos homens perplexos; digam-lhe que me foi dada
A terrível participação, e que possivelmente
Deverei enganar, fingir, falar com palavras alheias
Porque sei que há, longínqua, a claridade de uma aurora.
Se ela não compreender, oh procurem convencê-la
Desse invencível dever que é o meu; mas digam-lhe
Que, no fundo, tudo o que estou dando é dela, e que me
Dói ter de despojá-la assim, neste poema; que por outro lado
Não devo usá-la em seu mistério: a hora é de esclarecimento
Nem debruçar-me sobre mim quando a meu lado
Há fome e mentira; e um pranto de criança sozinha numa estrada
Junto a um cadáver de mãe: digam-lhe que há
Um náufrago no meio do oceano, um tirano no poder, um homem
Arrependido; digam-lhe que há uma casa vazia
Com um relógio batendo horas; digam-lhe que há um grande
Aumento de abismos na terra, há súplicas, há vociferações
Há fantasmas que me visitam de noite
E que me cumpre receber, contem a ela da minha certeza
No amanhã
Que sinto um sorriso no rosto invisível da noite
Vivo em tensão ante a expectativa do milagre; por isso
Peçam-lhe que tenha paciência, que não me chame agora
Com a sua voz de sombra; que não me faça sentir covarde
De ter de abandoná-la neste instante, em sua imensurável
Solidão, peçam-lhe, oh peçam-lhe que se cale
Por um momento, que não me chame
Porque não posso ir
Não posso ir
Não posso.
Mas não a traí. Em meu coração
Vive a sua imagem pertencida, e nada direi que possa
Envergonhá-la. A minha ausência.
É também um sortilégio
Do seu amor por mim. Vivo do desejo de revê-la
Num mundo em paz. Minha paixão de homem
Resta comigo; minha solidão resta comigo; minhaLoucura resta comigo. Talvez eu deva
Morrer sem vê-Ia mais, sem sentir mais
O gosto de suas lágrimas, olhá-la correr
Livre e nua nas praias e nos céus
E nas ruas da minha insônia. Digam-lhe que é esse
O meu martírio; que às vezes
Pesa-me sobre a cabeça o tampo da eternidade e as poderosas
Forças da tragédia abastecem-se sobre mim, e me impelem para a treva
Mas que eu devo resistir, que é preciso...
Mas que a amo com toda a pureza da minha passada adolescência
Com toda a violência das antigas horas de contemplação extática
Num amor cheio de renúncia. Oh, peçam a ela
Que me perdoe, ao seu triste e inconstante amigo
A quem foi dado se perder de amor pelo seu semelhante
A quem foi dado se perder de amor por uma pequena casa
Por um jardim de frente, por uma menininha de vermelho
A quem foi dado se perder de amor pelo direito
De todos terem um pequena casa, um jardim de frente
E uma menininha de vermelho; e se perdendo
Ser-lhe doce perder-se...Por isso convençam a ela, expliquem-lhe que é terrível
Peçam-lhe de joelhos que não me esqueça, que me ame
Que me espere, porque sou seu, apenas seu; mas que agora
É mais forte do que eu, não posso ir
Não é possível
Me é totalmente impossível
Não pode ser não
É impossível
Não posso.

Vinicius de Moraes, o verdadeiro poeta brasileiro, tenta resistir à poesia. O poema acima foi extraído do livro "Antologia Poética", Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1960, pág. 160.

sexta-feira, 13 de abril de 2007

O Amor do Soldado(1952)(dos versos do capitão)

Em plena guerra levo-te a vida
a ser o amor do soldado.

Com teu pobre vestido de seda,
tuas unhas de pedra falsa
te toco caminhar pelo fogo

Vem aqui, vagabunda,
vem beber sobre meu peito
rubro sereno.

Não querias saber onde andavas,
eras a companheira do baile
não tinhas partido nem pátria.

E agora a meu lado caminhando
vês que comigo vai a vida
e que detrás está a morte.


Já não podes voltar a dançar
com teu traje de seda na sala.
Te vais a rasgar os sapatos,
mas vais crescer na marcha.

Tens que andar sobre as espinhas
deixando gotinhas de sangue.

Beija-me de novo, querida
Limpa o fuzil, camarada


Pablo Neruda

domingo, 1 de abril de 2007

Tempos sombrios

Realmente, vivemos tempos sombrios!
A inocência é loucura.
Uma fronte sem rugas denota insensibilidade.
Aquele que ri ainda não recebeu a terrível notícia que está para chegar.
Que tempos são estes, em que
é quase um delito falar de coisas inocentes,
pois implica em silenciar sobre tantos horrores.

Bertolt Brecht

Quem se defende

Quem se defende porque lhe tiram o ar
Ao lhe apertar a garganta,para este ha um paragrafo
Que diz: ele agiu em legitima defesa. Mas
O mesmo paragrafo silencia
Quando voces se defendem porque lhes tiram o pao.
E no entanto morre quem nao come,
e quem nao come o suficiente
Morre lentamente.
Durante os anos todos em que morre
Nao lhe e permitido se defender.

Bertolt Brecht

Nada é impossível de mudar


Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente:
não aceiteis o que é de hábito
como coisa natural,
pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar

Bertolt Brecht

A flor e a náusea ( Carlos Drummond de Andrade)

Preso à minha classe e a algumas roupas,
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me'?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas,
alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.

Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas,
consideradas sem ênfase.

Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio,
paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horasda tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

domingo, 25 de março de 2007

O Operário Em Construção ( Vinicius de Moraes)

s E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe
num momento de tempo todos os reinos do mundo.
E disse-lhe o Diabo:– Dar-te-ei todo este poder e a sua glória,
porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero;
portanto, se tu me adorares, tudo será teu.
E Jesus, respondendo, disse-lhe:– Vai-te, Satanás; porque está escrito: adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás.
Lucas, cap. V, vs. 5-8.


Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asasEle subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.

De fato, como podia
Um operário em construção
Compreender por que um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia...
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento
Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse, eventualmente
Um operário em construção.

Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
– Garrafa, prato, facão –
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário,
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.

Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento!
Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.

Foi dentro da compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário.
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
– Exercer a profissão –
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.

E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.

E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.

E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.

Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão.
Mas o patrão não queria
Nenhuma preocupação
– "Convençam-no" do contrário –
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isso sorria.

Dia seguinte, o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu, por destinado
Sua primeira agressão.
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse:Não!

Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras se seguiram
Muitas outras seguirão.
Porém, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.

Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo vário.
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
– Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem bem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher.
Portanto, tudo o que vês
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.

Disse, e fitou o operário
Que olhava e que refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria.
O operário via as casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objetos
Produtos, manufaturas.
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse:Não!

– Loucura! – gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
– Mentira! – disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.

E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silêncio apavorado
Com o medo em solidão.

Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção

terça-feira, 20 de março de 2007

Somos Cinco Mil(Ultimo Poema de Victor Jara)

Somos cinco mil aquí.

En esta pequeña parte de la ciudad.
Somos cinco mil.


¿Cuántos somos en total
en las ciudades y en todo el país?
Somos aquí diez mil manos
que siembran y hacen andar las fábricas.

¡Cuánta humanidad
con hambre, frío, pánico, dolor,
presión moral, terror y locura!

Seis de los nuestros se perdieron
en el espacio de las estrellas.
Un muerto, un golpeado como jamás creí
se podría golpear a un ser humano.

Los otros cuatro quisieron quitar
se todos los temores,uno saltando al vacío,
otro golpeándose la cabeza contra el muro,
pero todos con la mirada fija de la muerte.
¡Qué espanto causa el rostro del fascismo!


Llevan a cabo sus planes con precisión artera sin importarles nada.
La sangre para ellos son medallas.
La matanza es acto de heroísmo.

¿Es éste el mundo que creaste, Dios mío?
¿Para esto tus siete días de asombro y trabajo?
En estas cuatro murallas sólo existe un número que no progresa.
Que lentamente querrá la muerte.

Pero de pronto me golpea la consciencia
y veo esta marea sin latido
y veo el pulso de las máquinas
y los militares mostrando su rostro de matrona lleno de dulzura.
¿Y Méjico, Cuba, y el mundo?

¡Qué griten esta ignominia!


Somos diez mil manos que no producen.
¿Cuántos somos en toda la patria?
La sangre del Compañero Presidente
golpea más fuerte que bombas y metrallas.
Así golpeará nuestro puño nuevamente.
Canto, que mal me salescuando tengo que cantar espanto.
Espanto como el que vivo, como el que muero, espanto.
De verme entre tantos y tantos momentos del infinito
en que el silencio y el grito son las metas de este canto.

Lo que nunca vi, lo que he sentido
y lo que sientohará brotar el momento....

Victor Jara, poeta e músico assassinado pela ditadura Chilena/Estadunidense

segunda-feira, 19 de março de 2007

ABC do Nordeste Flagelado

A — Ai, como é duro viver nos
Estados do Nordeste quando o nosso
Pai Celeste não manda a nuvem chover.
É bem triste a gente ver
findar o mês de janeiro
depois findar fevereiro
e março também passar,
sem o inverno começar
no Nordeste brasileiro.

B — Berra o gado impaciente
reclamando o verde pasto,
desfigurado e arrasto,
com o olhar de penitente;
o fazendeiro, descrente,
um jeito não pode dar,
o sol ardente a queimar
e o vento forte soprando,
a gente fica pensando
que o mundo vai se acabar.

C — Caminhando pelo espaço,
como os trapos de um lençol,
pras bandas do pôr do sol,
as nuvens vão em fracasso:
aqui e ali um pedaço vagando...
sempre vagando,
quem estiver reparando
faz logo a comparação
de umas pastas de algodão
que o vento vai carregando.

D — De manhã, bem de manhã,
vem da montanha um agouro
de gargalhada e de choro
da feia e triste cauã:
um bando de ribançã
pelo espaço a se perder,
pra de fome não morrer,
vai atrás de outro lugar,
e ali só há de voltar,
um dia, quando chover.

E — Em tudo se vê mudança
quem repara vê até
que o camaleão que é
verde da cor da esperança,
com o flagelo que avança,
muda logo de feição.
O verde camaleão perde
a sua cor bonita
fica de forma esquisita
que causa admiração.

F — Foge o prazer da floresta
o bonito sabiá,
quando flagelo não há
cantando se manifesta.
Durante o inverno faz festa
gorjeando por esporte,
mas não chovendo é sem sorte,
fica sem graça e calado
o cantor mais afamado
dos passarinhos do norte.

G — Geme de dor, se aquebranta
e dali desaparece,
o sabiá só parece
que com a seca se encanta.
Se outro pássaro canta,
o coitado não responde;
ele vai não sei pra onde,
pois quando o inverno não vem
com o desgosto que tem
o pobrezinho se esconde.

H — Horroroso, feio e mau
de lá de dentro das grotas,
manda suas feias notas
o tristonho bacurau.
Canta o João corta-pau
o seu poema funério,
é muito triste o mistério
de uma seca no sertão;
a gente tem impressão
que o mundo é um cemitério.

I — Ilusão, prazer, amor,
a gente sente fugir,
tudo parece carpir
tristeza, saudade e dor.
Nas horas de mais calor,
se escuta pra todo lado
o toque desafinado
da gaita da seriema
acompanhando o cinema
no Nordeste flagelado.

J — Já falei sobre a desgraça
dos animais do Nordeste;
com a seca vem a peste
e a vida fica sem graça.
Quanto mais dia se passa
mais a dor se multiplica;
a mata que já foi rica,
de tristeza geme e chora.
Preciso dizer agora
o povo como é que fica.

L — Lamento desconsolado
o coitado camponês
porque tanto esforço fez,
mas não lucrou seu roçado.
Num banco velho, sentado,
olhando o filho inocente
e a mulher bem paciente,
cozinha lá no fogão
o derradeiro feijão
que ele guardou pra semente.

M — Minha boa companheira,
diz ele, vamos embora,
e depressa, sem demora
vende a sua cartucheira.
Vende a faca, a roçadeira,
machado, foice e facão;
vende a pobre habitação,
galinha, cabra e suíno
e viajam sem destino
em cima de um caminhão.

N — Naquele duro transporte
sai aquela pobre gente,
agüentando paciente o
rigor da triste sorte.
Levando a saudade forte
de seu povo e seu lugar,
sem um nem outro falar,
vão pensando em sua vida,
deixando a terra querida,
para nunca mais voltar.

O — Outro tem opinião
de deixar mãe, deixar pai,
porém para o Sul não vai,
procura outra direção.
Vai bater no Maranhão
onde nunca falta inverno;
outro com grande consterno
deixa o casebre e a mobília
e leva a sua família
pra construção do governo.

P - Porém lá na construção,
o seu viver é grosseiro
trabalhando o dia inteiro
de picareta na mão.
Pra sua manutenção
chegando dia marcado
em vez do seu ordenado
dentro da repartição,
recebe triste ração,
farinha e feijão furado.

Q — Quem quer ver o sofrimento,
quando há seca no sertão,
procura uma construção
e entra no fornecimento.
Pois, dentro dele o alimento
que o pobre tem a comer,
a barriga pode encher,
porém falta a substância,
e com esta circunstância,
começa o povo a morrer.

R — Raquítica, pálida e doente
fica a pobre criatura
e a boca da sepultura
vai engolindo o inocente.
Meu Jesus! Meu Pai Clemente,
que da humanidade é dono,
desça de seu alto trono,
da sua corte celeste
e venha ver seu Nordeste
como ele está no abandono.

S — Sofre o casado e o solteiro
sofre o velho, sofre o moço,
não tem janta, nem almoço,
não tem roupa nem dinheiro.
Também sofre o fazendeiro
que de rico perde o nome,
o desgosto lhe consome,
vendo o urubu esfomeado,
puxando a pele do gado
que morreu de sede e fome.

T — Tudo sofre e não resiste
este fardo tão pesado,
no Nordeste flagelado
em tudo a tristeza existe.
Mas a tristeza mais triste
que faz tudo entristecer,
é a mãe chorosa, a gemer,
lágrimas dos olhos correndo,
vendo seu filho dizendo:
mamãe, eu quero morrer!

U — Um é ver, outro é contar
quem for reparar de perto
aquele mundo deserto,
dá vontade de chorar.
Ali só fica a teimar
o juazeiro copado,
o resto é tudo pelado
da chapada ao tabuleiro
onde o famoso vaqueiro
cantava tangendo o gado.

V — Vivendo em grande maltrato,
a abelha zumbindo voa
, sem direção, sempre à toa,
por causa do desacato.
À procura de um regato,
de um jardim ou de um pomar
sem um momento parar,
vagando constantemente,
sem encontrar, a inocente,
uma flor para pousar.

X — Xexéu, pássaro que mora
na grande árvore copada,
vendo a floresta arrasada,
bate as asas, vai embora.
Somente o saguim demora,
pulando a fazer careta;
na mata tingida e preta,
tudo é aflição e pranto;
só por milagre de um santo,
se encontra uma borboleta.

Z — Zangado contra o sertão
dardeja o sol inclemente,
cada dia mais ardente
tostando a face do chão.
E, mostrando compaixão
lá do infinito estrelado,
pura, limpa, sem pecado
de noite a lua derrama
um banho de luz no drama
do Nordeste flagelado.

Posso dizer que cantei
aquilo que observei;
tenho certeza que dei
aprovada relação.
Tudo é tristeza e amargura,
indigência e desventura.
— Veja, leitor, quanto é dura
a seca no meu sertão.

Patativa do Assaré

domingo, 18 de março de 2007

Acabei de chegar...

São 6:00h da manhã...
meu teclado quebrado,
o sono não vêm...
Dizem que somos livres...
Livres pra que?!?
Queria ser livre para amar,
ver o mar, sentir o vento
ao calor do Sol...
Mas além de tudo isso
Queria ser livre para poder
estar com a mulher que amo... e que me ama...

Somos livres?

Para que?

Queria ser livre para poder gritar...
ser livre para pintar
Ser livre para viver...

Viver?

ter?

temos?

Vivemos?

Somos?

Somos apenas mais no meio da multidão...
Para eles... somos apenas
números almentando suas $ifras...
E eu apenas queria
ser livre para viver, para pintar,
para sentir, para amar...

Fabiano Santos


 
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