Pérola

"Nós entendemos que Israel tem o direito de se defender pois nesses últimos anos o Hamas lançou diversos foguetes na região"
Barack Obama

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Linguagem e medo global

Na era vitoriana, as calças não podiam ser mencionadas na presença de uma senhorita.
Hoje, não fica bem dizer certas coisas na presença da opinião pública.

O capitalismo ostenta o nome artístico de economia de mercado, o imperialismo chama-se globalização.

As vítimas do imperialismo chamam-se países em vias de desenvolvimento, o que é como chamar de crianças aos anões.

O oportunismo chama-se pragmatismo, a traição chama-se realismo.

Os pobres chamam-se carentes, ou carenciados, ou pessoas de escassos recursos.

A expulsão das crianças pobres do sistema educativo é conhecida sob o nome de deserção escolar.

O direito do patrão a despedir o operário sem indenização nem explicação chama-se flexibilização do mercado laboral

A linguagem oficial reconhece os direitos das mulheres entre os direitos das minorias, como se a metade masculina da humanidade fosse a maioria.

Ao invés de ditadura militar, diz-se processo.

As torturas chamam-se pressões ilegais, ou também pressões físicas e psicológicas.

Quando os ladrões são de boa família, não são ladrões e sim cleptómanos.

O saqueio dos fundos públicos pelos políticos corruptos responde pelo nome de enriquecimento ilícito.

Chamam-se acidentes os crimes cometidos pelos automóveis.

Para dizer cegos, diz-se não visuais, um negro é um homem de cor.

Onde se diz longa e penosa enfermidade deve-se ler cancro ou SIDA.

Doença repentina significa enfarte, nunca se diz morte e sim desaparecimento físico.

Tão pouco são mortos os seres humanos aniquilados nas operações militares.

Os mortos em batalha são baixas, e as de civis que a acompanham são danos colaterais.

Em 1995, aquando das explosões nucleares da França no Pacífico Sul, o embaixador francês na Nova Zelândia declarou: "Não me agrada essa palavra bomba, não são bombas. São artefactos que explodem".

Chamam-se "Conviver" alguns dos bandos que assassinam pessoas na Colômbia, à sombra da protecção militar.

Dignidade era o nome de um dos campos de concentração da ditadura chilena e Liberdade a maior prisão da ditadura uruguaia.

Chama-se Paz e Justiça o grupo paramilitar que, em 1997, metralhou pelas costas quarenta e cinco camponeses, quase todos mulheres e crianças, no momento em que rezavam numa igreja da aldeia de Acteal, em Chiapas.


Eduardo Galeano

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